Aliás, há vários anos
que sabemos que a natureza não é razoável. Ela não se adapta à forma vulgar do
funcionamento da inteligência. Para a parte do nosso cérebro normalmente
utilizável, qualquer raciocínio é binário. Isto é negro ou branco. É sim ou não.
É contínuo ou descontínuo. A nossa máquina de compreender é aritmética. Classifica
e compara. Todo o Discurso do método se baseia nisso. Toda a filosofia chinesa
do Ying e do Yang também (e o Livro das mudanças, único livro de oráculos do qual
a antiguidade nos transmitiu as leis, é composto por figuras gráficas: três
linhas contínuas, três descontínuas em todas as ordens possíveis). Ora, como o
dizia Einstein no final da sua vida: Pergunto a mim próprio se a natureza joga
sempre o mesmo jogo.
Simplesmente,
falta-nos o método. Também nos faltava o método, há pouco tempo, para libertar
a energia nuclear. Mas talvez essas forças estejam apenas à nossa disposição no
caso de nós comprometermos, para as captar, a totalidade da nossa existência.
Os ascetas, os santos, os taumaturgos, os videntes, os poetas e os sábios de
gênio não dizem outra coisa. E é o que escreve William Temple, moderno poeta americano:
Nenhuma revelação especial é possível se a própria existência não for um instrumento
de revelação.
Ora, o que é o
símbolo, senão o modelo abstrato de uma realidade, de uma estrutura, que a
inteligência humana não pode dominar inteiramente, mas cuja teoria esboça? O
símbolo revela certos aspectos da realidade - os mais profundos - que desafiam qualquer
processo de conhecimento 2. Como o modelo que o matemático elabora a partir de
um objeto ou de uma situação que escapa ao bom-senso ou a experiência, as propriedades
do símbolo simulam as propriedades do objeto ou da situação assim abstratamente
representados, e cujo aspecto fundamental se mantém dissimulado. Em seguida
seria necessário que uma máquina eletrônica analógica fosse montada e funcionasse,
a partir desse modelo, para que o símbolo mostrasse a realidade que contém e as
respostas a todas as perguntas em vista das quais foi concebido.
O estado desperto.
Nem tudo está em tudo. Mas a vigília é tudo.
Bodhidarma, fundador
do budismo Zen, quando um dia estava em meditação,
adormeceu (quer dizer
que se deixou cair, por inadvertência, no estado de consciência habitual à
maior parte dos homens). Essa falta pareceu-lhe tão horrível que cortou as pálpebras.
Estas, segundo diz a lenda, caíram no solo, dando imediatamente lugar ao nascimento
do primeiro pé de chá. O chá, que protege contra o sono, é a flor que simboliza
o desejo dos sábios de se manter em vigília, e é por isso que se diz o gosto do
chá e o gosto do Zen são semelhantes. Esta noção do estado de vigília parece
tão velha como a humanidade. É a chave dos mais antigos textos religiosos, e é
possível que o homem pré-histórico já tivesse procurado atingir esse terceiro
estado. O método de datar com o radiocarbono permitiu constatar que os índios
do sudoeste do México,
há mais de dez mil
anos, absorviam certos cogumelos para provocar a hiperlucidez. Trata-se sempre
de mandar abrir o terceiro olho, de ultrapassar o estado de consciência vulgar
onde tudo é apenas ilusão, prolongamento dos sonhos do profundo sono. Desperta,
dorminhoco, desperta! Dos Evangelhos aos contos de fadas é sempre a mesma
admoestação.
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